Uma pessoa morando na rua é um absurdo. Quem quer que seja. É muito perverso, ainda mais em um país que está gastando bilhões de reais construindo estádios de futebol que serão entregues de mão beijada para a iniciativa privada. Ver uma pessoa morando na rua é mais revoltante ainda quando sabemos, como o jornal O Globo noticiou no último domingo (25), que os senadores e seu parentes têm, de forma vitalícia, todas as despesas médicas pagas com dinheiro público.
Enfim, uma pessoa morando na rua é um absurdo. Ponto. Agora, ver o baixista da Legião Urbana morando na rua, no Centro do Rio, como mostrou a Record no último domingo, consegue ser pior. Porque, além da questão humana, ou desumana, a situação de rua do Renato Rocha é a mais bizarra evidência do fracasso de um política cultural no Brasil.
O Negrete, gostando ou não de Legião Urbana, é um patrimônio cultural do país. Ele participou de três grandes discos de uma das maiores bandas de rock do Brasil. A banda foi e ainda é um fenômeno da música brasileira, com uma relação com os fãs beirando a devoção religiosa. A discografia da Legião Urbana foi recentemente relançada em digipacks (aquela embalagem de CD em forma de livro), sendo vendida nas bancas e em lojas de CD. As pessoas compram até hoje o disco de uma banda, cujo baixista é morador de rua.
Todo morador de rua deve ser atendido pelo poder público para que possa ter o seu direito a uma moradia assegurado. No caso de Negrete, caberia também a algum órgão ou entidade de músicos ou da cultura intervir na questão. Sei lá. Sindicato dos Músicos, Ministério da Cultura, a gravadora EMI, algo para além da discussão dos direitos autorais. Os problemas psicológicos de Renato Rocha evidenciam o que é mais que óbvio: alguém tem que fazer alguma coisa.
E, como se já não fosse revoltante o suficiente, que paumolecência foi essa do Dado Villa Lobos e do Marcelo Bonfá? Na reportagem da Record, os dois não quiseram se pronunciar sobre o Negrete. O que será que Renato Russo diria?